Na horta Bons Frutos, uma trituradora de galhos para plantar brincando

Construir a Papa-Galhos em duas semanas mostrou que a inovação e o design colaborativo podem unir-se ao conhecimento popular e fortalecer as iniciativas cidadãs

A inovação é a palavra da vez entre governantes, empresários e intelectuais. É vista como solução para problemas das grandes cidades e também como fonte de lucro para empresas e empreendedores. A inovação tira o sono dos universitários e enche as prateleiras das livrarias. Estamos todos afogados em termos de língua inglesa, novos aplicativos, redes sociais, dispositivos e atualizações. Na corrida pela mais-nova-tecnologia-de-ponta-que-vai-transformar-a-humanidade não consideramos a hipótese de que a inovação pode estar em volta de casa e não somente no Vale do Silício, na Califórnia, Estados Unidos, pode falar português e ser fruto da criatividade popular.

No Hackathon na Horta, uma atividade contemplada pelo Circuito LABxS (Lab Santista), a ideia era construir uma trituradora de galhos movida a pedaladas para a Horta Comunitária Bons Frutos em apenas duas semanas.

Maria Augusta Bueno é fundadora do São Paulo Lab e está acostumada a esse tipo de desafio. Mas durante essa maratona encontrou outras aventuras. Magu, como é conhecida, vive em outra cidade e não conhecia a comunidade do jardim São Manuel, zona noroeste de Santos.


“Confesso que superestimei a condição de não ser daqui. Achava que iria nas escolas e universidades e seria suficiente para despertar o interesse, mas foi mais difícil do que imaginei”, conta. Ela explica que tudo mudou quando viajou para Santos e bateu na porta das casas das pessoas explicando o projeto. “Fizemos o mapeamento ‘olho-no-olho’”, disse.

Um time heterogêneo e complementar

A Bons Frutos é a primeira horta comunitária de Santos. Ela foi construída ha dois anos em um terreno cedido pela CPFL (companhia de energia) e conta com apoio do Instituto Elos, uma organização da sociedade civil sediada em Santos que desenvolve trabalhos comunitários em todo o planeta.


No cotidiano, é tocada por três moradoras do bairro e colaboradores que plantam uma série de verduras e vendem a preços populares para a comunidade.
Vilma Lúcia, 61, dona de casa e empreendedora da horta, confessa que ficou um pouco desconfiada do desafio. “No começo eu não acreditei e não entendi muito bem. Quando a Maria falou que tínhamos apenas duas semanas para terminar o projeto achei que era muito pouco. Mas não duvidei porque acredito nas pessoas. Foi muito corrido”, conta.


Realmente, o tempo era curto. E talvez o desafio não teria sido possível sem a ajuda dos moradores do bairro. Maria Augusta teve a sensibilidade de unir o conhecimento local com o conhecimento técnico da engenharia e design colaborativo. O time foi armado com um engenheiro como mentor, um soldador e um mecânico, estudantes e colaboradores com especialização em permacultura.


Cesar Branco , engenheiro, foi convocado para ser o mentor do projeto. “Não conhecia o lugar. Vim aqui pela primeira vez para o projeto e foi muito bacana. É uma comunidade muito organizada. É no mínimo animador trabalhar em um bairro que tem uma horta com esse potencial. Em um terreno que poderia estar inabitado e foi cedido para população”, disse.

Ele conta também que não teve dificuldades em lidar com os técnicos locais. “Dei instruções, mas também recebi dicas deles. A obra não foi minha. Foi comunitária, de fato”, avalia.

Conhecimento de uma vida para a comunidade

Um dos fazedores locais que contribuiu para o projeto foi o mecânico aposentado Claudio Jardim “Eu moro aqui no bairro, ou melhor, na rua da horta. E já desenvolvi o sistema de irrigação da plantação”, explica. Ele conta que não teve dificuldades para a execução do projeto. “Tenho conhecimento da área que dominei a vida inteira. Tenho todo equipamento, máquina de solda e lixadeira”, disse.

Jardim explica todos os passos para construção: projeto colaborativo; detalhamento; busca do material; particionamento das pecas; e montagem, que foi realizada em apenas dois dias.

“Foi cansativo, o tempo da maratona é curto, mas conseguimos deixar a peça funcional para o uso da horta. Vivo aqui perto e certamento vou ajudar na manutenção, levar para casa e fazer alguns ajustes”, garante. “Nunca havia pensado que meu conhecimento podia ajudar a comunidade. Não tinha imaginado essa possibilidade. É muito gratificante saber que apesar de já estar aposentado, ainda posso ajudar a horta”.

Comida saudável para o bairro; comida saudável para o brasileiro

Cleuza da Silva Machado, empreendedora da horta, quer ver o progresso da Bons Frutos. “Vender verduras orgânicas para o povo. Pela saúde da comunidade, minha família, filhos e netos”, conta.

Apenas três pessoas trabalham regularmente na horta e nela plantam alfaces, couve, chicória, couve, beterraba, entre outras verduras.

“Gostei da Papa-Galhos. Vai ajudar na manutenção dos galhos. A decomposição vai ser mais rápida e ainda vai ajudar na nossa saúde. Vamos pedalar todo dia. Só temos a agradecer”, disse.

Para Cleuza, a horta é mais do que um passatempo ou ganha pão. “Comemos muito agrotóxico, Precisamos levar comida mais saudável para a mesa do brasileiro”, defende.

Embora o Circuito LABxS (Lab Santista) não tenha exigido dos projetos êxito, ou seja, o erro era consentido aos participantes, o São Paulo LAB conseguiu atingir seus objetivos iniciais e criar uma ferramenta sustentável para incrementar a compostagem na Horta Bons Frutos. A Papa-Galhos tem consumo zero de energia e ainda estimula o exercício físico de quem a opera.

“Uma surpresa positiva que ficou evidente no evento de inauguração da engenhoca foi o sucesso que ela fez com as crianças”, conta Maria Augusta. “O aspecto lúdico do seu uso pode ser explorado como uma ferramenta de educação ambiental”.

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